quinta-feira, 31 de março de 2016

Expriência Pós-Construtivista

O Princípio



Sempre me pareceu que o mundo conspirava a meu favor, hoje tenho a convicção que sim. Estava em casa quando recebi uma ligação da escola, uma colega minha paralela do 1º ano, única turma que lecionara até então, me convidando para participar de um curso que fora designado para as professoras do Laboratório de Aprendizagem e que por algum motivo não haviam aceito convite. A conversa fora mais ou menos assim:

(colega) - A direção me ligou agora há pouco perguntando se aceitamos participar de um curso do GEEMPA para trabalhar com crianças não alfabetizadas, mas ninguém sabe ao certo onde, como e para quê e precisamos dar a resposta agora.

(eu) - Sempre tive curiosidade de conhecer o GEEMPA, ouço falar mal e ouço falar bem, gostaria de ter a minha opinião. O que tu achas?

(colega) - Eu quero fazer.

(eu) - Então vamos!

(colega) - Tudo é conhecimento e crescimento e depois se não gostarmos não precisamos seguir.

(eu) - Tudo bem!

Semana de Páscoa de 2006, nossas turmas foram atendidas por outras professoras e nós estávamos às sete horas da manhã na SMED do município de Viamão junto a um grupo de mais ou menos quarenta outras professoras e duas assessoras as quais não conhecíamos.

Posso ainda sentir as dramáticas que nos permeavam: a ansiedade, o nervosismo, as expectativas, os pensamentos que rodopiavam como uma dança em torno de imagens criadas por todos estes sentimentos que se misturavam em doses menores e por momentos em doses maiores conforme íamos nos aproximando do local de nossa primeira formação como professoras Geempianas. As dúvidas permaneciam, mas a curiosidade nos movia ao encontro do novo saber. Continuávamos rumo ao City Hotel no centro de Porto Alegre.

Ao chegarmos ao local fomos recepcionadas por um grupo de mulheres (até então não sabíamos quem eram) que escreviam nosso nome em crachás e identificavam o município ao qual pertencíamos. Logo nos guiaram até um salão de eventos e ao sentarmos nos entregaram um questionário com perguntas que pensava eu até aquele momento ter respostas para cada uma delas. Ao olhar para frente percebi a presença dela, aquela que simbolizava o novo para mim: Esther Grossi. Agora sim posso dizer que tudo começou: os sentimentos até então já haviam sido desfrutados por mim em outras ocasiões, mas quando comecei a responder aquele questionário e as falas do encontro iniciaram seu trabalho dentro do meu ser, a dor fez com que a ansiedade, a curiosidade, o nervosismo sucumbissem. Que dor! Senti-me chicoteada, iniciei um processo de negação do novo, resolvi comer, cochilar, ir ao banheiro, a sede tomou conta de mim, o tempo que tanto pedia que fosse mais generoso e vagaroso agora parecia ter me atendido em dobro por todas as preces que fiz.

Naquele momento este fora um dia que eu queria deletar e voltar correndo para a minha sala de aula, o mundo ao qual eu tinha o controle e sabia, previa tudo. Pobre de mim!!!

Ao findar a noite minha cabeça parecia carregar as chagas do mundo, culpa, medo, dor, ignorância, vulnerabilidade. Voltaria eu para aquilo que denominei de "o tronco" para continuar sendo açoitada ou desistiria e diria à maldita sorte dane-se o desconhecido.

Recordei-me de meu pai e minha mãe que sempre me disseram com suas atitudes que paciência e perseverança são virtudes e que um compromisso assumido deve sempre ser cumprido, lembrei-me ainda de ditados populares como: "depois do temporal, vem a bonança" e decidi eu dar uma chance a conspiração do mundo de me provar que estava errada.

Ao decorrer dos dias parecia tudo piorar. Como assim? Para ensinarmos devíamos nos despreocupar com as dificuldades de aprendizagens, agora a hiperatividade deveria desaparecer tão rápido quanto surgiu, a doente era eu que não desejava o suficiente alfabetizar todos para manter-me em um grupo de profissionais que têm como parâmetro a reprovação de seus alunos para medirem o grau de exigência e excelência de seu trabalho. Meus colegas e todos os estudos que fiz em anos  de magistério é que estavam na contramão do ensinar.

Mas tudo foi ficando ainda pior, aparece então em meio a todas as palestras e atividades uma dinâmica de trabalho intitulada "grupos áulicos" nunca havia se quer ouvido falar nisto. Que horror! Não bastava para elas (todas as Geempianas) abrir minhas feridas, agora queriam tocar nelas.

Para tanto, expuseram meu grau de conhecimento dentro de um parâmetro formalizado por elas (pensava eu até então), fizeram uma votação que eu não entendera nada e jogaram-me para um exílio em meio a multidão. Eu que sempre fora solicitada para qualquer atividade, seja ela acadêmica, familiar, social, que repetidas vezes fui líder de turma, sempre vista como uma pessoa muito comunicativa; agora não fora escolhida por ninguém. O que acontecia ali, ninguém me viu? Queriam me sabotar? Tinham medo de mim? Eu representava uma ameaça?

Enquanto estas questões se formavam em minha mente, minha alma ansiava uma outra resposta, do porquê de tudo aquilo? Não entendia a necessidade a qual me submeti a passar, minha vida estava em ordem, não havia motivos para me colocar naquela situação tão dolorida.

Mas se a dor ensina a gemer, o gemido ensina a crescer. Já havia vivido trinta anos, mas nada fora tão perturbador como os três dias de assessoria. Após a eleição de grupos o exercício era um alfabeto dos sentimentos, devíamos escrever sentimentos que nortearam a dinâmica dos grupos áulicos; enquanto o grupo discutia à procura de um sentimento com a letra "a", corri logo para o "d" e escrevi "desespero", este foi o único sentimento que consegui externar.

Ao final destes três dias tudo parecia ter voltado ao normal, retornei para a minha sala de aula,minha turma, meus alunos, meu controle, porém algo me perseguia além da minha colega que queria colocar em prática a metodologia com a sua turma e gostaria que eu fizesse também, havia ainda os gemidos da dor e quando estes pareciam sumir, deixavam o eco.

Eu já não era mais a mesma, mas nada de concreto havia mudado...





(texto escrito por mim em 2006 depois de  meu primeiro contato com o Pós-Construtivismo, após o sofrimento incial, segui os estudos e a metodologia e alfabetizei 100%  dos meus alunos em 6 meses. )  

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